sábado, 24 de agosto de 2013

De tantos e's.


E pensar no oblíquo instante em que nossos olhos se desgrudaram devagar; a semântica se entorta e não consegue explicar - tínhamos tudo e não tínhamos nada. Sem o sentido habitual do beijo, as semelhanças não significam coisa alguma. E fomos assim: o nada interrompido, a delícia de sentir o outro que não se concretizou. A palavra sorrindo disfarçada por não ser a pessoa que está do outro lado da escada rolante quando alguém corre abraçando o vento procurando por outro alguém.

E você tinha tudo. Meu ritmo e meu samba, coisa que só um bamba tem as manhas de profanar. E eu te entendo também, não é fácil, mas é lógico. Teu ufanismo quase retardado pelos signos que até anteontem foram a última moda, tuas caras e bocas pelas safadezas idiossincráticas do último nome a fazer a última coisa mais bela que te fazem parecer uma senhora de meia idade a procurar um cara sincero e romântico numa mesa de boteco e a tua mania boba de me cortar sempre que eu queria mostra que eu, sim, eu, que estava ali bem do seu lado, sou bem mais carismático do que qualquer outro bosta que, só por quê aparece na televisão, tem duzentos e noventa e dez seguidores no twitter, é apenas uma maneira menos alegórica de mostrar-se por inteira e mais palatável aos seus pares degustadores de ilusão.

E ainda que você continue a mesma apesar destes pesares sinceros que a ti dedico, fica a memória confusa dos dias que eu passei entornando até a última gota de saudade das suas sentimentalidades todas. Sou um cara que ama e não peço em momento algum algo em troca. Nem seu conhecimento dos Beatles, muito menos seus olhares. E vou passando mesmo que meus amigos do peito digam que isso é bobagem, que eu me apaixono diferente a cada semana diferente, que você é só mais uma no meu picadeiro de emoções e que o circo não está pegando fogo para que eu fique desse jeito, tão transtornado, na esperança de te ver novamente.

E você que se pareceu tão minha por ligação dos pontinhos não foi nada. Sério, sem culpa. Eu armado com meus melhores poemas e você só se utilizando do escudo de Agostinho num épico desleal e sem chances de revide. Eu fui um idiota e você parece rir disso agora. O fato é que eu estou cagando para as suas conjecturas falso-estéticas de um mundo mais amoroso - desde que seja com a pessoa que lhe sorridentemente atrai. E você que foi a minha vida e passa a ser apenas um capítulo caprichoso da minha história, o que dirá quando me ver em outros abraços que não os teus? Fingirá rancores como fingiu amores?

Margot de tantos sonhos, Margot de tantos planos, será que a imaginação longínqua não consegue te alcançar? Que serei eu sem os dias que, sem cessar, planejei pra nós dois? E o padre fica só no altar. E eu fico só a te querer. A gente ainda vai virar um filme de amor. Isso se ainda houver tempo de você vir bater na minha porta e dizer que esteve errada.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Intrépido passado.



Recentemente adicionei uma amiga dos tempos de escola no facebook. Abro aspas para o tempo que não a via e, de primeira vista, ela parecia mais alta, mais bonita e muito mais evoluída do que nos anos que passamos juntos resolvendo equações de geometria II. Uma quase ruiva de cabelos presos por um lenço azul e uma vontade imensa de reencontrar as pequenezas da juventude perdidas em algum lugar do tempo. Encurtando, ela solicitou e eu apenas aceitei.

Pouco tempo após essa investida do passado bater em minha porta virtual numa terça feira a tarde eu publiquei em meu perfil um link que dizia em palavras clichês que eu havia postado uma nova poesia no meu blog. Acho até meio careta ficar mostrando isso pra todo mundo por que parece uma espécie de mendicância de um abraço, mesmo que a distância, um apelo sentimental por um comentário ou coisa que o valha mas, na verdade, essa é realmente a intenção. Sou solitário e carente, algum problema? O lance é que ela curtiu. Curtiu como todas as pessoas curtem; olhando com um certo desdém e clicando em tudo que vê pela frente.

A coisa mais engraçada foi que ontem, lá pelas tantas, sentado numa mesa de boteco alguém bate no meu ombro. Quando eu virei e vi aquelas coxas que foram a felicidade de toda a turma do segundo ano do ensino médio, fiz uma carinha de oi, tudo bem, quanto tempo, né? e a abracei timidamente convidando-a pra sentar comigo e talvez até dividir uma cerveja. Sim, ela estava ainda muito mais bonita e interessante do que aquele corpo de ninfeta que a fez ser meu sonho de consumo por tanto tempo. Conversamos e conversamos e conversamos sem que eu tirasse meus olhos inquisidores daqueles olhos que se rendiam sem nada lutar.

Daí que ela solta a frase mais intrépida da noite: não posso acreditar que um cara que escreve tão bem foi meu colega de infância e mora bem ali. Não tive outra opção a não ser retrucar com a mesma loucura: eu que não posso acreditar que você mora bem ali e foi minha colega de infância. Deste momento em diante o que era pra ser um encontro e talvez um sexo after bar tomou uma proporção de uma discussão digna de internação. Ela, muito curiosa sobre os meus dotes literários, continuou: e os seus sonhos, como são? Pensei puta que o pariu, meus sonhos? E fui sincero: eu sonho cor de rosa e quase sempre eles terminam com um porquinho vomitando o arco íris.

Da noite com uma gata como aquela me sobrou apenas a conclusão de que as pessoas acreditam que poetas são como dragões e, tal como, elas vão te perseguir como se você fosse o último deles. Te cercarão sem dó nem piedade, balançarão seus cabelos de fogo e te queimarão numa fogueira de perguntas estúpidas sobre o amor e coisas do tipo. E fui embora. Ela ficou lá conversando com o garçom - que não escrevia nada mas era bem mais bonito do que eu. 

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Retrovisor, loiras tequileiras e um amor que se basta.



Difícil era não ter no semblante a chaga de você entrando no portão, olhando de relance eu sumir pela esquina. Carros tem retrovisores para que se observe seu amor entrar em casa fingindo que não parou uma última vez para te desejar boa sorte, vai com Deus. Acreditar no impossível segundo em que eu deveria ter segurado sua mão e pedido pra ficar só mais um pouco é o que me mantém imerso neste oceano bobo. Aconteceu, de certa forma, o que estava escrito que iria acontecer - um beijo tímido nas suas bochechas cor de rosa, foi legal, a gente se vê. Mas você sabe o que eu queria mesmo, como também sei o que você desejava em seu universo particular. Sempre existe uma outra vez e é nisso que me apego para não ligar pra você esta noite. Sempre existe uma outra vez para que finalmente nossas direções se encontrem, uma outra vez para que eu desista de falar descontroladamente amenidades e vá direto ao ponto, ei, mocinha, fica um pouco mais que eu vou te contar um segredo... e só. Não deve doer. Ser homem o suficiente pra dizer coisas que demonstrem certa credibilidade para um definitivo beijo de boa noite. Eu posso fazer isso.

A noite terminou com um sorriso tétrico: voltando pra casa ouvindo uma música eletrônica que eu não sei o nome e sentindo uma falta imensa do que tinha acabado de acontecer. Você não sabe o quanto de saudade cabe no coração de quem tem inveja até dos bem-te-vis que são mais rápidos que eu e vão te acordar de manhã com aquela cantoria cínica. Havia plantado sem a menor vergonha na cara a semente que, se você aguar direitinho, vai florescer como florescem em algum lugar os lírios que encomendei pra te dar de presente quando nos vermos novamente. E eu vou abrir a porta do carro também. E vou parecer um bocó talvez, não importa. Quando eu te ver de novo eu quero fazer tudo como manda o figurino pra noite acabar ainda melhor do que acabou hoje, compro até fogos de artifício se for necessário. Tudo que for preciso para assistir de novo o espetáculo do seu sorriso, este sorriso que me basta e que, paradoxalmente, me faz querer ainda mais.

Dormir e acordar com a sua onipresença despertando minha memória, encontrar até nas embalagens sedutoras de alvejante a sua silhueta e procurar nos classificados uma casa espaçosa que caiba com conforto o nosso futuro compuseram discretamente meu script semanal. Além de umas horas de trabalho e algumas cervejas, é claro. Também não pude começar ou terminar qualquer que fosse a conversa sem que seu nome aparecesse como um comercial das Casas Bahia durante o intervalo do filme preferido, como uma planta que quebrou o vaso e parece que já criou raízes no meio da sala e não há maneiras de tirá-la dali. E foi assim, como se a vida fosse não mais que um emoticon sorridente, que se passaram não sei quantos dias de borboletas no estômago, de mãos atrevidas procurando um telefone pra alcançar o macio constante das suas cordas vocais.

Aperfeiçoo minha sapiência em biologia explicando meu amor autótrofo; ele se consome e se basta. Não se intimida ao menor perigo de não ter o outro. Tem em suas entranhas o alimento necessário pra sobreviver o tempo que for preciso pra ouvir nem que seja o som do bipe do celular quando não quer me atender. E ele, esse amor que pinica, estará com você também. Na fila do banco uma senhora comentará com outra sobre as peripécias amorosas de sua mocidade - e você vai se lembrar de mim. O sujeito que embala seus sorvetes de flocos no supermercado fará uma piada sem graça sobre portugueses no aeroporto - e você vai se lembrar de mim. Prestes a chegar em casa, na calçada onde por vezes conversamos, ali também você vai se lembrar de mim. E eu, sem nem mesmo estar ali, serei uma risada descompromissada de quem se lembrou de algo por acaso e ficou muito grata por essa faísca de lembrança acender o sol do seu dia. Essa auto suficiência sentimental é o que me permite ficar em casa, por horas e horas, sem esboçar nem um traço de amargura por não tê-la comigo, olhando suas fotos na internet.

Não sei quando voltarei a ter ver e isso incomoda um pouco, eu admito. Gostaria que fosse agora, que você me mandasse um torpedo dizendo que não aguenta mais de tanta ansiedade de me ver falando tudo isso ao vivo e a cores mas, se não for pra ser neste instante, okay, pra mim tá ótimo. Apenas queria que você soubesse que em mim, apesar do que dizem, é verdade. Prometo não decepcionar esta ausência na presença de abraços que não sejam os seus e não medir esforços para atar-me ao nó que me prende do mundo de loiras tequileiras e morenas de salto quinze. Serei seu enquanto houver estoque de amor na minha dispensa. Mesmo que isso pra você seja bobagem. Mesmo que pra mim seja difícil apagar do semblante a chaga do seu sorriso ao entrar no portão.

 

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Conexões II




"E um dia os homens descobrirão que esses discos voadores estavam apenas pesquisando a vida dos insetos."
Mário Quintana

Um fora sutil. A melhor maneira de começar esta história é dizer que ela está acabada – apesar destas linhas tortas eu não tenho vocação pra correr atrás. O amor é amor e ponto, não existem diferenças do que acontece aqui para o que acontece em Nice. E eu gosto de você. Mesmo. Quando me deparo com estes seus olhinhos negros eu tenho realmente a impressão do pra sempre. Este pra sempre que dói pra caralho quando estou sem créditos pra te ligar. Este mesmo pra sempre que eu espero que um dia passe.

Você que já está na minha vida há tantas vidas, como não pode perceber que o cartão era muito mais importante que as flores? Em que planeta segurar a mão de alguém quando esta estiver triste é apenas um sinal amiguinhos-que-vão-se-twitar-pra sempre? Olha na minha na cara e me diz o que você vê, só pra eu ter a certeza de que quem não está confundindo é você. A priori, eu não preciso disto, mesmo sabendo que o que mais me atrai em você sou eu do seu lado necessitando cada dia mais de você.

Bem provável que você nunca mais vá me ver. Também estou mudando de planos, de rumo e de cidade. Se acaso nos encontrarmos algum dia numa dessas esquinas que dão para aquilo que você quer esquecer, eu vou te dar bom dia e perguntar da sua vida, e você talvez até quem sabe fará o mesmo, me abraçando sem querer.  Alguém dirá que está atrasado e vai virando as costas, sumindo outra vez entre os carros, homens e semáforos. Este é o roteiro pro futuro disso que ingenuamente chamei de amor  e, com todo esse carinho-amigo que você diz sentir por mim, siga a risca.

Já não somos quem eu planejei e não caminharemos lado a lado nesta calçada por muito tempo, tenho coisas pra arrumar – livros, discos, amigos e, por que não, um outro alguém divertidíssmo como você, com o sorriso tão lindo quanto o seu e com essa sensibilidade quase que angelical que eu tanto admiro quando vai se vestir. Eu gosto de você. Mesmo. Mas acabou, tem que acabar. Não levemos mais adiante o que tá na cara que não vai dar em nada. Nossas retinas escancaradamente unidas hoje só me provam que eu fui um idiota em acreditar no óbvio, no que estava na cara e que por isso acabei por precipitar as coisas. Tudo volta a ser como era antes. Sério, por mim tudo bem. Eu que já estive por noites inteiras acordado pensando num filme de nós dois, sou agora Lars Von Trier me animando com o sucesso da melancolia.


Minha solenidade com a perda de um amor que eu jurava e queria e desejava que um dia fosse assistir televisão com a face enrugada e a sensação de dever cumprido ao meu lado não é de hoje. Tenho aprendido com o tempo o que Vinícius sacou com o vento “... que seja eterno enquanto dure.” E também levo coisas incríveis de você comigo. A sua risada tímida, por exemplo. Isso vai ficar em mim como ficarão os passarinhos que gorjeiam agora, naquela que já foi a nossa janela pra vida. Eu gosto de você. Mesmo.    

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Exceção


De pensar em ti um tanto
com o amor que me faz pouco
nego-me o tempo e louco
apenas agradeço - e canto

O que de ti me faz assim
sorrir e lembrar sem querer
que tudo aqui hoje é você
e nada mais depende de mim

De pensar em ti um tanto
deu-se vida ao que era encanto
e não é preciso entender

De pensar em ti um tanto
dei para o infinito azul e manso
a chance de te ver.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Amor ecumênico.

O infinito instante então perdura e eu vou pensando nela enquanto passeio os dedos por meus cabelos anelados. Protelar a vida procrastinando a história; essa é a metade do que cabe a um homem que ama. A outra parte é saudade. Observo um casal de meia idade entrando com seus filhos numa padaria. O que lhes reserva o destino hostil do amor? O que de sagrado e profano existe naquelas mãos dadas? Eu penso nela como quem pensa em santidade, com a justa medida entre idolatria e carnaval.

Abro um parentese: é feliz quem tem alguém pra pensar. Faço planos pro reveillon e me lembro que ela não está aqui. O sonho vago, a metáfora incompleta somos nós dois. Percebo agora que já há algum tempo me permito deixar levar pela incerteza das suas inserções oníricas. Eu tenho fé em Deus e isso basta. Portanto que me sobrem espaços para que caibam em mim todas as suas intenções.

Muito me interessa sua lógica de cantar com os passarinhos - se alguém me disser que é mais feliz que isso eu duvido. Tenho seu rosto pregado na parede da memória, a foto que nunca tiramos abraçados, e me sinto bem. Eu tudo e nada. Amor taoísta de deixar de ser para ser ainda mais. Procuro então seu telefone em vão e eu vou acreditando que mesmo assim tudo pode ser melhor amanhã. Tudo verdade. Tudo amor. Tudo que não consigo dizer enquanto estou com você.

Eu vou pensando nela por que a amo e isso eu descobri brincando de estar ao lado dela, na alegoria do pra sempre, chamando-a de meu amor.