quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Quando a gente não escolhe mais.

Quando eu te conheci você tinha certeza de tudo e, aos poucos, fui me apaixonando pelo seu jeito resoluto de lidar com as coisas mais complexas como escolher entre um cineminha ou tomar um porre de tequila. E fui me perdendo, me deixando desaparecer ao seu lado e nem vi quando você deixou de ser essa pessoa que tinha tudo preparado pra se tornar alguém que não pensava em nada mais do que suas próprias decisões.

E eu  fui ficando ali de lado, fazendo parte da mobília, esperando você se definir. Juntando grana pra comprar um carro mais novo, escolhendo aquela cômoda vintage, fazendo a moça da loja mostrar e dobrar todo o estoque de roupas do mostruário. De vez em quando até batendo meus pés despudoradamente no assoalho na esperança de que você notasse que eu também estava ali esperando uma definição: ei, e nós, como é que fica?

Você sempre com seus assuntos para serem resolvidos urgentemente, seu telefone insuportável que nunca parou de tocar, mudando a ordem das almofadas da cama e quase sempre optando por lençóis de solteiro. Eu ali no canto, insistindo em silêncio que você ainda pensasse na gente, que parasse um pouco pra perceber que sim, sempre gostei de tudo como estava, nada precisava mudar além da direção dos seus olhos.

Até o dia que eu não estive mais afim de esperar você resolver a sua vida. Por que sempre foi assim: a sua vida e nunca a nossa vida. O dia que eu também decidi descongestionar a minha, pôr minhas coisas no lugar. Sei lá, de repente pra que você caísse na real e sacasse que talvez eu tenha me apaixonado por aquele carro que só pegava no tranco, que eu sempre achei melhores as velhas almofadas que guardavam seu cheiro e que aquela cômoda que você gastou uma nota pra comprar me fazia ter pesadelos. Mas naquele momento você tinha coisas demais pra pensar e, mais uma vez, esse assunto ficou pra depois.

Ontem a noite sua mãe me ligou, disse que você anda meio deprê, que perdeu a vontade de sair nas sextas feiras e que fala de mim o tempo inteiro. Bom, ainda gosto de você se quer mesmo saber. Mas estou feliz e tenho a impressão que já é tarde demais pra nós, não acha? Espero que você se cuide e que tenha mais clareza nas suas próximas definições, que você saiba decidir o que é prioridade e sempre opte pelo calor de um abraço à trabalhar até mais tarde pra comprar um ar-condicionado. Quanto a nós, sinto muito, agora não dá mais.




quinta-feira, 17 de setembro de 2015

A última vez.

A primeira vez que o amor me pegou eu estava atravessando a rua de mãos dadas com meu avô. Era de noite e eu vi um caminhão de mudanças parado na frente do portão da menina mais bonita da escola e, nessa noite, ainda muito menino, eu percebi o quão dolorida era a beleza de gostar de alguém.

A segunda vez que o amor me pegou, me lembro bem, entendi que a gente se apaixona mesmo é pelos detalhes: um sorriso bobo na fila do lanche, um abraço sem contexto, o jeito como alguém ajeita a roupa quando se levanta. Falo isso por que a segunda vez que o amor me pegou foi por uma das gêmeas idênticas da quarta série, tão iguais que até a professora se confundia. Mas eu não. Poderia listar cada minúscula diferença que fazia eu suspirar por uma e não por outra.

A terceira vez que o amor me pegou eu também me senti amado e o nosso primeiro beijo seria um daqueles momentos perfeitos para ilustrar uma juventude curiosa, cheia de dúvidas e tão carente de certezas. Mas acabou. Ficou o aprendizado de que o sentimento tem lá seu manual oculto de sobrevivência - um passo em falso e bam! tudo está acabado.

Meus amores número quatro, cinco e seis também me pegaram de jeito. Cada um à sua maneira mas todos com o mesmo ensinamento: paciência e vodka curam qualquer ferida. Amores que deixaram marcas importantes em mim, marcas que doeram absurdamente pra cicatrizar e que hoje servem de lição como um joelho ralado tanto pode significar que correr nem sempre é a melhor ideia como uma lembrança de que a brincadeira foi do caralho. Pro resto, Merthiolate.

A última vez que o amor me pegou eu tinha tinha um plano preparado: resolveria tudo com uma boa dose de Vinícius de Moraes e algumas rosas vermelhas. Mas as coisas não são tão simples como eu esperava e novamente me perdi quando você elogiou qualquer coisa em mim. Meus óculos, minha voz, sei lá, não lembro. Eu poderia apenas ter dito obrigado e continuar meu caminho habitual, mas a vida é feita de escolhas, baby, e a minha foi, a partir daquele momento, te amar pra sempre sem deixar o próximo amor acontecer.






domingo, 13 de setembro de 2015

Amor e carinho acompanha.


Não gosta de coisas pela metade aquela moça. Não, definitivamente ela odeia o copo meio vazio, as conversas interrompidas antes do final, os passos que não chegavam a lugar algum. Tinha nascido pra ser inteira e, por isso, acorda todo dia proclamando sua independência na frente do espelho. Nunca sai de casa com um destino certo, certeza mesmo era só a de que vai chegar onde quiser. Basta um batom vermelho, a grana pro táxi, um sorriso escancarado e o infinito pousa na palma da sua mão como um passarinho atrevido. 

Que a verdade seja dita: toda fortaleza também tem suas brechas e pontos fracos. E ela observa com uma ternura desproporcional aos seus um metro e sessenta e nove os casais de mãos dadas pelas calçadas como se pudesse absorver o que quer que fosse daquelas sutilezas apaixonadas. Também tem vontade de se perder e nunca mais se encontrar dentro de um abraço mas, sabia bem, aquela talvez não fosse a hora certa.

Nunca teve muito apego às coisas materiais aquela moça. Sempre achou que eram muito mais valiosos os presentes que o dinheiro não pode comprar. Um beijo lambuzado de sorvete de flocos, por exemplo. Ou os olhinhos daquela melhor amiga quando se encontram no shopping. Acredita que o mais caro, na verdade, nunca teve preço. Por isso sempre opta por tomar um chopp com a galera do que trocar o celular.

Sabe, ela até gosta de yoga, de uma tal de meditação transcedental e vive postando textos de algum indiano com a sabedoria milenar de ser foda. Mas ela anda tão sem tempo que prefere tratar suas angústias, neuras e paranóias bebendo uns bons drinks com a velha turma de sempre, no mesmo bar de sempre, aquele que ela chega dando oi pra todo mundo e chamando o garçom pelo apelido carinhoso e pessoal. Traz mais uma, Bigode, pra equilibrar o chácra!

Aquela moça é linda apesar de não ser a mais bonita. Talvez não tenha exatamente os predicados de uma top model mas isso não a impede de ouvir um fiu fiu vez ou outra atravessando o sinal. Aquela moça tem orgulho de voltar na padaria e devolver o troco que veio a mais. Orgulho de acordar cedo e trabalhar feito gente grande pra pagar as contas do mês. Aquela moça gosta do copo cheio e de tudo que vem acompanhado de amor e carinho.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Assim seja.

Hoje vai ser a última vez que te escrevo. A última vez que vou me lembrar que cada foto sua me faz um bem imenso e a última vez que te prometo as coisas mais bonitas esta noite. Hoje, e por enquanto, nada mais vai me fazer faltar o ar, nada mais vai me prender o pensamento; nem livros, nem trabalho, nem nada. Hoje, a última vez que te escrevo, vai ser o dia que seremos felizes para sempre em cinco parágrafos e algumas outras linhas.

Não que você tenha alguma coisa a ver com isso, mas é foda pra mim. Já não tenho mais idade pra ficar me propondo ao abate sentimental de ficar puxando assunto dia sim, dia não, na internet esperando qualquer migalha de atenção da sua parte. Mas até que eu estava gostando de me sentir com quinze anos de novo, na larica da mocinha sorrir da piada mais sem graça. Não nego e acho até que me aturar deve ser um exercício constante de paciência. Só que acabou. Hoje é a última vez que fico bad ao ver você com outro. Hoje, a última vez que te escrevo, só quero lembrar do que foi bom.

Dói pra caralho, sabia? Dói por que eu cultivei você, reguei você, fiz de tudo para que você florescesse em mim da forma mais bonita. Só que anda doendo demais e isso não é bom. Não adianta eu vir com as conjecturas mais poéticas de que o amor é assim mesmo, que é necessário todo esse sofrimento para servir de inspiração para os meus textos mais avassaladores. Sou do século vinte e um, baby, tente me entender, lido melhor com vídeos games do que com poemas de amor.

No mais, você não tem quase nenhuma culpa nessa história afora o fato de poder ter me dito não há algum tempo atrás. Culpa por não ter sido estúpida o bastante pra dar o fora logo de cara e insistir em me levar em banho maria até hoje: o dia que não dá mais. O dia que esquecerei amanhã junto com a cor dos seus cabelos. Junto com todos os momentos que me senti o mais imbecil por falar as coisas mais profundas tão fora de hora. O dia em que decidi parar de escrever pra você.

Bem provável que eu não deixe de gostar de tudo que habita em mim quando penso nos seus olhinhos caramelos e que nenhuma outra moça que eu tente usar como escudo fará com que você deixe de estar presente em cada acorde da minha guitarra. É foda. Mas deixa. Você está feliz e eu quero que continue assim. E, pra te dizer a verdade, na vida eu sempre consegui tudo o que eu quis. O lance é que agora eu não quero mais. Ponto final.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Dentro de você (ou uma flor que brotou no asfalto).

Imagine a cena: de um lado da mesa um cara chora. Mas chora muito, copiosamente. Que fique bem claro, este sujeito não sou eu. Nesta história, pelo menos, eu sou apenas o observador maduro que tende a assistir a tudo com um olhar empírico. Do outro lado você sente sono, vergonha e só. Passa a mão pelo cabelo, checa as mensagens no celular, dá uma bocejada bem-servida de desprazer e pede a Deus em silêncio que aquela noite chegue ao fim.

Bom, o chorão em questão poderia ser aquele amigo ativista desolado pelo derretimento das calotas polares, poderia ser um colega de trabalho se lamuriando pela não promoção ou até mesmo um bêbado que se sentou sem a sua permissão para declamar dramaticamente um poema da Florbela Espanca. Mas aquele cara, baby, é só um rapaz qualquer que ficou putamente feliz em te encontrar naquele barzinho e, sei lá, por um descuido da sua sanidade resolveu puxar uma cadeira e se sentar com você.

De longe não dá pra saber direito por que ele ficou tão triste de uma hora pra outra mas eu tenho lá minhas sugestões. Um: ele pode ter perdido a carteira e, ao ver um rosto conhecido, correu pra pedir ajuda. Dois: depois da terceira dose ele se lembrou do cachorro que fugiu no parque e nunca mais voltou. Três: era uma nuvem carregada e bastou uma mudança no clima para ele virar tempestade. Pela minha experiência acredito de olhos vendados na última opção, mas que vento forte era esse para desabar tamanho temporal?

Você faz um gesto tímido para o garçom que já conhece bem a deixa; era a hora de trazer a conta. Seus olhos já não escondem o tédio por estar ali vendo um cara barbado se declarando entre lágrimas e martinis com gelo e limão. Só queria ir pra casa e fazer o de sempre: entrar na internet, fuçar todos os sites de textos apaixonados só pra postar no facebook aquele que melhor combinasse com seu vestido de solidão. Depois dormir e sonhar com o príncipe encantado que vai até tão-tão distante a bordo do seu cavalo branco, enfrentando ogros e dragões pelo caminho, só pra encontrar você perdida na torre mágica.

No fundo, no fundo acho que você gostaria mesmo era de dar um tapa na cara daquele idiota. De dizer pra ele que amores reais são uma grande furada, que se declarar para a pessoa amada passou a ser blasé há três anos atrás. Que esperar e nunca falar é hype. Que talvez tenha medo de se arriscar. Que toda aquela cara de bunda é só uma armadura da moça frágil que se tornou. Que morre de vontade de se entregar loucamente e que poderia ter ficado a noite inteira ali ouvindo aquele cara se abrindo da forma mais bonita e verdadeira que já viu e ouviu. Que não importa o que aconteça: o importante é a caminhada, o resto é só calçada.

Apertou o botão de compartilhar e esperou as curtidas subirem. Mas essa noite você sonhou com ele. Tenho certeza.

domingo, 30 de agosto de 2015

Imagine.

Todos os amores estavam impregnados naquela velha camiseta preta com a cara do Jim Morrison. Aquela que me acompanhava quase sempre. Meu uniforme de guerra. A incrível coincidência de, sempre que usada, ter o poder de encontrar alguém legal até mesmo nas festinhas dos amigos de uns amigos meus.

Alguém como a Ana, que sempre foi incrível e que eu conheci no aniversário de noventa anos da senhorinha que mora no 508. Alguém como a Marisa, que me abraçou sorridente depois de ter chorado a tarde inteira depois de ter assistido Marley e Eu. Alguém como a Rebeca, que tinha a mania de usar minhas roupas como travesseiro. Alguém como tantos alguéns. Bom, aquela camiseta hoje não me serve mais.

Não que eu esteja ficando mais gordo, mais magro ou tenha crescido alguns centímetros. Nada disso. Apesar da cara desbotada do Jim ainda me fazer um bem imenso, todos aqueles cheiros ficaram pra trás quando eu conheci você enquanto usava a camiseta dos Beatles. E agora eu não quero conhecer mais ninguém que não seja tão legal quanto os óculos do John e tão imprevisível como o bate papo da uol.

Talvez essa camisa fique ainda guardada por muito tempo. Talvez ela nem vá conhecer de verdade os seus abraços. Mas nenhuma outra faz tocar Yellow Submarine dentro do meio peito como esta quando vejo você on line. Nenhuma outra faz tanto sentido quando você, do nada, diz oi. E aí, baby, here comes the sun.

Você, mesmo de longe, se transformou no meu transtorno mais rock n' roll. Naquilo que eu jamais me imaginaria vestido mas que, de alguma forma, cai tão bem em mim. Como se quatro caras geniais nunca tivessem atravessado a Abbey Road. Como se Paul morasse na Nicarágua e o Ringo no Japão. Uma dia desses a gente se encontra. Ou não. Mas saiba que, dessa vez, essa camiseta só serve pra nós.



terça-feira, 25 de agosto de 2015

Sobre casamentos, distâncias e um sujeito piadista.

Antes que tudo que eu diga e escreva e mentalize possa parecer uma mentira, preciso falar que é desleal gostar de você, saiba disso. Nem Vinícius de Morais seria páreo para aquele cara que também adora os seus olhinhos castanhos e que, apesar de não recitar nem batatinha quando nasce, te encontra todo dia e te convida para um chope. Pra quem mora longe, a dúvida é a estética do amor e seria bonito se não fosse piegas afirmar que o passatempo de quem ama é pintar o ser amado com as tintas da saudade. Mas isso é chato pra caralho e não faz você gostar de mim do mesmo jeito que eu gosto de você. Eu tenho uma pilha de páginas com seu nome escrito. Ele conta piadas e ninguém ri. Bom, mas ele esbarra com você tipo... sempre.

Por isso, um dia desses eu disse vai para tudo de você que ainda havia em mim. E disse com tanta força, e repeti tantas vezes, que a única coisa que eu realmente poderia esperar é que você não fosse, que não desabitasse das minhas lembranças, que não tirasse toda essa mobília que eu aprendi a esbarrar toda noite. Disse vai pra ter a certeza de que você não iria. Disse vai em alto e bom som pra sentir na garganta arranhada - e não no peito que bate, não na memória que pulsa - que você vai ficar.

O lance é que eu queria estar aí ou que, de repente, você estivesse aqui pra me dizer pessoalmente que a festa foi demais mas a noite sempre acaba e que todo carnaval tem seu fim, que sonha em achar o cara especial que vai te pedir em casamento e talz. Pra eu confidenciar no pé do seu ouvido que eu não tenho pensado em outra coisa além de você entrando pela igreja vestida de noiva. Mas é foda. Não dá pra fazer isso pelo facebook. E parece que nesse conto de fadas o piadista sem graça terá mais sorte que o poeta apaixonado.

De qualquer forma, não fique aí pensando que eu sou um egoísta. Jamais. A sua felicidade será sempre a minha felicidade. Não tenho ciúmes, apenas torço para que o cara que tiver a honra de uma valsa nupcial com a mulher da minha vida sinta pelo menos a metade do amor e respeito que tenho. Já que ele terá pra sempre a alegria de acordar todo dia ao seu lado, que tenha o compromisso de se levantar primeiro e te trazer o café na cama.

Enquanto isso eu vou gostando de você a distância, com um poema em cada mão, a cada dia mais admirado. A cada dia mais pirado. Me desmoronando à simples possibilidade de um oi. Perdido dentro desse caos construtivo que é amar você sem perturbar seu sono.


segunda-feira, 20 de julho de 2015

Pra minha amiga, com amor.

Aqui não tem esse negócio de ficar duas horas plantado debaixo do prédio esperando ela se arrumar. O negócio é diferente: sobe aqui e fica no sofá enquanto tomo banho e penteio o cabelo. Sem frescuras que não agregam nada - a gente racha a conta e ri da etiqueta pra fora um do outro sempre que é necessário. Fala palavrão na casa dos pais alheios sem querer e pede desculpa; mas sem remorsos, que fique bem claro. É que a gente se gosta. E por gostar muito um do outro a gente se respeita. Não é disso que fala o manual do amor?

Eu já era amigo dela antes de me apaixonar loucamente por aqueles arrotos que antes me enojavam. Mesmo quando ela dizia rindo descaradamente: mulheres arrotam, sabia? Era aquele cara que a ajudava nas coisas mais improváveis do mundo em troca de ter alguns minutos de mãos dadas pelo shopping. Coisas que a gente fazia (e faz) um pelo outro sem pedir, talvez até sem perceber. Coisas que foram crescendo, crescendo e consumiram tudo que havia em volta.

Vamos namorar? ela perguntou numa espécie de retórica que só as garotas mais incríveis conseguem alcançar e já foi ela mesmo respondendo: olha, já fazemos isso, já fazemos aquilo, já fazemos tudo juntos, se você reparar bem já somos um casal. A cara dela ter esses lapsos de questionamento existencial inoportunos, como naquele momento em que eu saboreava meu big mac. Mas eu queria. Queria muito. Queria tanto que eu tinha até um plano. Namoraria se ela aceitasse meu convite para assistir pela milésima vez Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças. E claro que ela topou, afinal de contas, as últimas novecentas e noventa e nove vezes foi também com ela do meu lado sujando o sofá com sorvete de flocos que o filme passou.

Nesse dia eu a beijei pela primeira vez. Rindo como sempre. E foi ótimo. Foi como andar por um parque todo final de semana e depois de cinco anos descobrir que em algum lugar tinha uma cachoeira pra se refrescar. Desse dia em diante não paramos mais de nos beijar. E de rir. E de perguntar desnecessariamente um para o outro se ainda tem refrigerante na geladeira, se alguém deixou um embrulho mais ou menos assim e se a gente ainda se ama.

Uma amizade que virou amor. Um amor que virou amizade. Um clichê necessário se você ainda acredita que as coisas sempre darão certo no final. Uma verdade inquestionável se você ainda acredita que as coisas estão aí, dando certo sempre.

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Tão só quanto eu.

Você está aí agora lendo o que escrevi. Quase consigo ver por um instante um sorrisinho no canto da sua boca, aquele precipitar maroto do coração quando, mais uma vez, descobriu que todas essas linhas tortas foram feitas pra você. Você está trabalhando e acabou de combinar com o pessoal de saírem esta noite pra tomar um chope e conversar bobagens. Alguém reclamou estar sem grana - o aluguel, o gás, a vida; tudo está muito caro. Ninguém topou. Daí você passou a acreditar que seria um dia triste, sem ninguém pra dividir sua solidão até dar de cara com esse texto e bam: uma felicidade clandestina passa a invadir cada poro, fazendo arrepiar cada pelinho loiro do seu corpo claro.

Você está tão só quanto eu, admita. Sei até que você está se sentindo irritada, sufocada com esse cara que reapareceu Deus sabe quanto tempo depois na sua vida e que vem escrevendo poemas de amor com seu nome na internet. Mas sei também que esse cara sou eu e que, mesmo você não gostando, não vai me dizer pra parar. Você é educada demais, talvez até boba demais, pra ter uma atitude assim e, acima de tudo, sei que essas bobaginhas todas que você lê podem ser a parte mais reconfortante do seu dia. Então, resta-me declarar que te dedico toda a minha poesia como se fossem afagos no seu cabelo.

Você vai chegar em casa, girar a chave do seu quarto e perceber que esqueceu a televisão ligada. E eu aposto que não vai se importar. Vai abrir uma cerveja, entrar na internet e mandar uma mensagem para aquela amiga que você já não vê faz tanto tempo. Aí você vai inventar prazeres, omitir dissabores e talvez até contar que eu, mais uma vez, andei insistindo em escrever pra você. Que cara chato - ela irá dizer. Você manda uma carinha de concordância mas suspira outra vez ao pensar que existe alguém bem longe lembrando de você, querendo compartilhar um vinho e alguns sorrisos.

Um dia vai ser diferente, isto é, se você quiser. Um dia eu paro de marcar você nas minhas publicações e você vai se perguntar o que aconteceu. Um dia eu falo tudo isso pessoalmente pra você perceber que em mim nada é decorado além dos seus olhos caramelos que são os mais lindos que já vi. Um dia, quem sabe, a gente junta essa solidão e sai pra dançar a música que você mais gosta. Um dia, talvez um dia, quando você entender que tudo isso é verdade e houver disponibilidade em algum avião, pode me chamar. Eu vou.

terça-feira, 14 de julho de 2015

Petit Delice.



"Para quem ama,
 não será a ausência a mais certa, 
a mais eficaz, a mais intensa, 
a mais indestrutível,
 a mais fiel das presenças?"
Marcel Proust

Coisinha linda que é você - disse sem reparar muito bem no cabelo e no português desarrumados. Já era quase uma da manhã e eu passava da décima caipirinha de saquê quando vi você passar com aquela mistura de delicadeza e inocência presa num frasco de um metro e sessenta e poucos. Meio tarde e eu já pra lá de Vladivostok resolvi as palavras da minha gramática mais sacana.

Cheio de savoir faire, fui me travestindo numa espécie de Alain Delon de butequim falando dos seus cabelos negros com a poética que só os melhores filósofos de zona conseguem alcançar. E você me disse seu nome - detalhe bobo que minha memória seletiva não consegue lembrar - quando eu já me encontrava perdido do seu lado dentro daquela madrugada imensa.

Foi se ajeitando em meu peito como um pássaro perdido reencontrando o velho ninho, matando o frio com cachaça, poemas russos e elogios ao pé do ouvido, se deixando levar pra casa por este rapaz cheio de frases feitas. Talvez eu tenha chegado na hora certa, como num filme esquisitão, antes da mocinha se jogar do décimo quinto andar. Talvez não.

Não pediu para eu subir nem perguntou se eu aceitaria um café bem forte. Me negou solenemente seu telefone e revelou baixinho talvez nunca mais voltar àquele bar. Disse pra eu não me lembrar mas deixou escapar que nunca iria esquecer enquanto rasgava uma página de Proust que carregava antes de dobrá-la  para colocar suavemente no bolso do meu paletó xadrez. Era isso. Beijou minha bochecha esquerda e partiu.

Hoje, petit delice, me lembrei de você sem que eu quisesse e você permitisse. Discutindo Maiakóvisk com uma outra moça parecidíssima em tudo contigo. Os olhos verdes e infinitos. O sorriso bobo e talvez até um pingente de golfinho como o que você usava o dia em que te conheci. O mesmo bar. Quase tudo sem você.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Enquanto for amor, lembrança.


Me lembro que tocava Blur quando eu vi você indo embora e se perder na noite escura. Você disse que já não dava mais e saiu carregando suas mágoas, algumas lágrimas e uma bolsinha de bordas douradas. Lembro que fiz uma cara de bunda, dessas que a gente faz quando finge não estar nem aí, antes de você se despedir e eu pedir a décima primeira dose de conhaque. Acho que não disse adeus. Acho que sequer olhei em seus olhos quando você partiu.

Me lembro que duas semanas antes do fim a gente estava até bem, até feliz por ter tomado a decisão de adotar um cachorro de rua ao invés de comprar um buldogue francês de sei lá quantas mil dilmas. Lembro quando a gente encontrou o Duque todo sujinho debaixo de uma árvore ostentando toda aquela vira-latice maravilhosa e você disse que, a partir daquele momento, ele seria nosso filho enquanto não tivesse filhos humanos e que, mesmo depois de nascidos, nossos filhos humanos seriam irmãos do nosso filho cachorro. E a gente riu disso. E a gente ficou puto com isso depois que descobriu que teria que se desfazer do carro por causa do cheiro que o Duque presenteou com sua chegada. E a gente riu de novo. Muito mais até.

Me lembro que a gente brigou feio naquela sexta a noite. Só não lembro o por quê. Talvez tenha sido pela toalha molhada em cima da cama, talvez por querer sair com aquela velha camisa do Hendrix que me fazia parecer um soldado hippie combalido acabando de chegar do Vietnã. Talvez por tudo isso e muito mais. Custo a acreditar em clichês estereotipados onde as mulheres brigam por falta de opção ou de assunto. Acho que foi um acúmulo de coisas que fiz e que deixei de fazer. Sim, foi isso. Um ponto pra mim por admitir com humildade meus erros e fraquezas.

Me lembro que não tocou Blur quando eu acordei. Me lembro que não tocava nada além do bumbo sem ritmo dentro do meu peito. Me lembro que senti uma falta imensa de ver você abrindo as persianas. Lembro que não consegui chorar. Era só lembrança e uma dor seca e funda - talvez apenas ressaca. Lembro que peguei o telefone mas não senti a mínima vontade de te ligar. Queria apenas ficar passando as fotografias pra lá e pra cá. Percebi que tinha vindo antes no apartamento e levado o cachorro. Me lembro ainda do bilhete: apesar do lindo desejo de ficar, sou obrigada a ceder à necessidade feia de partir. E talvez nunca mais voltar. Um beijo.

Pra me lembrar, agora, vira e mexe volto àquele bar e peço outro conhaque e confesso que nunca mais lavei o carro. Pra me lembrar de como era o seu rosto eu imploro a todos os caras fodões em computação que eu conheço para recuperar os arquivos que deletei do pc e do celular uma dessas noites pra trás. Pra me lembrar estou cuidando de outro dog simpaticíssimo a quem dei o nome de Duquesa (okay, ele é macho, mas juro que eu fico na expectativa dele e do Duque se apaixonarem e formarem o primeiro casal gay da história dos vira-latas). Pra me lembrar fico ouvindo mil vezes o recado da secretária que gravamos juntos: não estamos aqui, talvez uma outra hora. Até.

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Vamos dar uma volta.


Não sou, nunca fui e, se Deus quiser, nunca serei seu admirador secreto. Tenho calafrios só de me imaginar calado diante de tudo que você é e representa pra mim. Prefiro me definir como seu admirador discreto: te amo mas não te encho o saco. Te dedicar um poema e uma oração já me basta. 

Vem, me dê aqui sua mão, vamos virar a esquina. Sei que tá frio pra caralho lá fora mas, se você tiver afim, meus braços ficam bem charmosos quando viram cachecóis. Pra começar, eu sei que você sabe que eu gosto de você - já te disse isso tantas vezes - mas sempre fico extremamente curioso pra saber o que você faz depois que me declaro. Seria uma careta? Seria um sorriso? Seria uma careta e um sorriso do tipo: que cara tonto, me acordando às três da manhã só pra dizer que me ama...? Eu gostaria mesmo de descobrir o que você faz com tudo isso que te dedico.

Sabe, de certa forma é um mundo que ofereço, não é qualquer panfleto de promoção que a gente lê depressa depois amassa e joga fora. É a possibilidade de dividir lençóis, cafés e sorrisos. Mas também não é o fim do universo se você não aceitar. Você já tem um mundo só seu e, pela lógica, ninguém pede um coração novo se o velho ainda bate perfeitamente. De qualquer forma, fica a oferta e, como já disseram antes, bilhetes sempre serão mais bonitos que as flores.

Por essas e outras que as vezes adoraria ser um mosquitinho só pra estar aí e ver suas reações diante das coisas que te escrevo. Será que passa as mãos pelo cabelo loiro? Será que franze a sobrancelha ou só deleta mesmo? Será que vai dormir com cara de boba? Será que já tinha ouvido isso antes? Afinal de contas, o que eu sinto não pede apenas um simples desejo de estar com você, é mais que isso, exige querer saber de você; o que é mais complicado mas tão mais bonito.

Isso pode ser bem chato, eu admito. Principalmente sendo o destinatário alguém que não goste de canções de amor e finais felizes (Deus, faça com que este não seja um caso assim!). Mas, sabe de uma coisa, eu prefiro tentar. Mesmo. De verdade. Não quero ficar quieto e eu acho que, acima de tudo, você não merece uma vida de silêncios. Me dê sua mão, vamos dar uma volta.




quinta-feira, 18 de junho de 2015

Tão longe.


Hoje eu fui convidado para uma exposição daquelas que a gente fica em pé e come pequenas coisas em pedacinhos de blindex. Convidado para uma daquelas festas que os meus amigos vão sorrindo de mãos dadas com as suas namoradas sem saber que, no final das contas, todo mundo sai com o coração lustrado e de barriga vazia. E eu não fui.

Hoje eu sonhei com o mínimo de você que ainda me cabe e fiquei por horas e horas pensando: porra, o que é que eu ainda tô fazendo aqui? E me lembrei de todos os trampos chatos, de tudo que eu preciso fazer de longe pra ter uma pequena oportunidade de estar aí com você. E me chegou o convite. E eu pensei em te ligar. Não te liguei.

Já faz um tempo e você sabe - foi impossível omitir, desculpa - eu poderia ser enquadrado como louco. Louco como aqueles que escrevem cartas de amor sem explicação. Loucos como eu que só esperam uma notícia boa. E eu fico feliz por tudo.

E é incrível como você me prende: não sou seu. Não poderia ficar um minuto longe de você se estivesse aí e isso é quase uma antítese do que sou, talvez por isso eu te ame de longe, devagarinho, para os bem-te-vis que existem dentro de mim não se assustarem. Eu amo você como os passarinhos que estudam semiótica e te perturbam todo dia às sete horas da manhã.

Não é minha, por mais que venhas em sonhos - e tantos sonhos - me dizer o que fazer. E eu já fui tão longe em dizer que te amo, falta você me falar que quer ser amada.

sexta-feira, 1 de maio de 2015

A fotografia.

Gosto dos seus olhos brincando na fotografia -  a alegoria fantasmagórica que Machado sonhou. Um ser não sendo. Alguma coisa que me prende, que me devora naquela imensidão negra de sobrancelhas firmes. Um passo em falso e bam! Lá estou eu perdido no infinito do seu olhar.

E eles brincam de querer alguma coisa; como uma criança que se apressa a abraçar o mundo antes de dormir e só deseja a urgência quente de uma aventura pra sonhar. Agora, ainda longe, me resta imaginar o objeto pretendido como se também fosse de interesse meu apenas pelo fato de ser seu, um querer arbitrariamente compartilhado por mim. Triste glória de gostar de alguém.

Pode ser um bem como pode ser um céu estrelado, o que os seus olhos negros procuram já é a própria busca e isso me encanta. Como quem observa a vida. Como quem deseja a vida como poucos. A fotografia já tem sua legenda particular e subjetiva: aqui estou e não há nada que me prenda.

quinta-feira, 26 de março de 2015

Encaixe.

E a solidão encontrou outra solidão e saíram, as duas, de mãos dadas. E o nó da saudade foi se afrouxando, se afrouxando até ninguém mais saber por que tinha parado ali. Não era destino, karma ou qualquer coisa do tipo, era a felicidade dando as caras como o sol depois da chuva. Dois pedaços diferentes do que parecia ser para sempre se encontrando numa esquina qualquer. Duas metades destruídas ensaiando a falta que todo jovem precisa ter. E foi lindo. Alguém tirou uma fotografia e todo mundo viu.

Aqueles olhos obnublados e aquele diadema de estrelas cadentes tinham em comum o pouco que lhes restava do muito que um dia já foram e encararam um ao outro, primeiramente, como o espelho convexo das próprias decepções, cada um contando suas histórias partidas, os medos, as madrugadas insones. E os sorrisos foram se compreendendo, as mãos se identificando até que alguém disse fica, não vá embora agora não.

Dali não tinha mais volta: quando se abre a porta para o inesperado é inútil aguardar o passado conhecido. Os abraços ficaram constantes, as risadas cada vez mais presentes e tudo foi se encaixando nos espaços vazios que existiam entre aqueles dois. Ele pedindo mais uma cerveja e falando agora das coisas que virão. Ela assistindo ele com aqueles olhinhos de quem acha que o mundo poderia acabar ali, naquele instante. E os ombros ficaram cada vez mais convidativos, as explicações cada vez mais inúteis e, como era de se esperar, alguma coisa aconteceu ali.

Não se desgrudavam mais. Ele ouvia cada letra do alfabeto dela e se sentia cada vez mais envolvido com aquele beabá recheado de histórias da infância, da vida difícil de estudante e de como foi divertido tê-lo conhecido. Ela fazia cara de boba e passava as mãos pelo cabelo toda vez que o via, sem rodeios, passear o olhar por seu corpo - era uma sensação nova essa de se perceber intensa e doadora, uma alegriazinha que crescia lá no fundo e explodia sem se perceber.

Não que eles tenham perdido totalmente o receio do adeus, afinal de contas, de tudo fica uma herança. Mas passeavam fingindo que aqueles balões coloridos e as borboletas serão para sempre, com os dedos entrelaçados para terem a segurança de que não vão se soltar por qualquer besteira a toa. Duas completudes que se encontraram do nada para se perder dentro daquilo que temiam: o amor aconteceu onde já não havia amor. Como a flor que nasce no asfalto simplesmente pelo fato de que deveria mesmo ser assim.



segunda-feira, 23 de março de 2015

Quando acaba.

Ela olhava pra ele dez, vinte, cem vezes por dia. Tinha arrepios só de pensar que, de repente, ele pudesse dizer em uma só palavra tudo aquilo que ela não queria ouvir. Pensava nele atendendo o telefone às três e meia da manhã, a voz de sono, falando que acabou. E sóbrio. Porque quando bêbadas, as pessoas sempre tem o direito de se enganar e seria completamente compreensível no dia seguinte ele se arrepender e pedir mil desculpas por aquela noite de embriaguez.

Mas acabou. Acabou, moça. Pra sempre. Todo aquele sono perdido foi por nada. Na verdade, é bem provável que nem tenha começado e os pés juntinhos debaixo do cobertor tenham sido somente algum delírio tropical. Nunca aconteceu, nunca foram ao parque de mãos dadas, nunca assistiram Satyricon e jamais sujaram o sofá com sorvete de flocos. Sua vida foi construída na tela do computador.

Talvez se ela tivesse coragem de pegar o telefone dele com aquela amiga do trabalho, talvez se esbarrasse com ele nas Lojas Americanas ou até mesmo mandado uma mensagem no Facebook, o mesmo Facebook que foi palco dos melhores sonhos da sua vida, ele pudesse dizer que também sentia o mesmo, que também já imprimiu uma foto sua e a colocou, despretensiosamente, debaixo do travesseiro, que a amava, assim, de longe. Mas não.

Acabou. Acabou, moço. Acabou quando ela pediu um mojito uma noite dessas e ele veio totalmente despido da saudade que insistia em provocar. Quando, de uma vez por todas, o excluiu de todas as redes sociais, de todos os planos e arrepios. Não foi por ninguém em especial, ela ainda admite que encontrar outro como ele vai ser bem difícil, foi por que foi. Como tem que ser.


É possível que ele nunca vá perceber a ausência daqueles olhos vidrados na sua foto de formatura e que aqueles olhinhos caramelos não vão mais chorar por ele. No mais, ele vai continuar publicando sua vocação pra sedutor com a mesma aptidão de sempre, só que agora com menos uma curtida. Por que agora, moço, ela está feliz e não há frase do Caio Fernando Abreu que a faça voltar atrás.

domingo, 8 de março de 2015

Miss Berigo.

Amanhã ou depois a gente esquece. Esquece que foi estranhíssimo duas pessoas se conhecerem assim. Esquece que duas pessoas tão iguais e, ao mesmo tempo, tão diferentes possam ter tido uma experiência mágica de se encontrarem e conversarem sobre qualquer bobagem até de manhã. Bom, eu vou esquecer, é fato. Mas isso não quer dizer que eu não possa deixar registrado o quanto isso foi importante pra mim pra eu poder lembrar dessa história quando tiver noventa anos.

Foi importante pra caralho por que eu andava meio perdido, buscando mais ter do que ser; sair com a mina mais bonita, pagar a conta de todo mundo e só falar de política. Importante por que eu me lembrei de quem eu era há dez anos atrás, daquele cara que se interessava por cinema e que via nas pequenas coisas a importância de se estar vivo.

Vou ser agradecido a você pelo resto da minha vida por me abrir os olhos para o essencial:estava mesmo sendo um retardado e você teve a coragem de dizer isso sem deixar escapar a delicadeza e a espiritualidade que eu aprendi a amar em você. Sei que pude mesmo ter confundido as coisas mas, você há de convir, quando a gente se depara com o infinito sempre dá vontade de se jogar.

Isso tudo é só pra dizer obrigado. Não são essas pequenezas que nos farão grandes. E se eu nunca mais tiver o privilégio de falar com você, fica aqui a minha gratidão. Um beijo.

quarta-feira, 4 de março de 2015

No bate-papo.



E no domingo ele acordou pensando. Já não fazia aquelas pequenas estripulias há tanto tempo que nem se lembrava mais o gosto de um sorriso bobo, desses que a gente dá sem perceber. E ele sorria pra tudo. Deu bom dia às grandes coisas e às pequenas também. Conversou em silêncio com as margaridas na janela, dançou valsa com a vassoura e decidiu , naquele azul salpicado de branco, nunca mais perder aquela loucura de se apaixonar pelos detalhes.

Naquela manhã ele pôde ver a linha traçada no meio de tudo: não foi por acaso e, se parece estranho a gente conhecer alguém às duas e meia da madrugada, imagina quem não tem coragem de se permitir; a velha rotina de sempre preenchendo os espaços e servindo de adereço para as noites de sábado, três doses de whisky, uma conversa amarga e solidão.

Ele gostou dela - até das mentirinhas bobas que ela contou quando começaram a se falar, pra ele, foram incríveis. O jeito que ela dizia: fica no ar isso, fica no ar aquilo, fizeram mesmo ele sair do chão. Poderiam se ver um dia, quem sabe tomar uma cerveja e bater um papo cara a cara, conhecer pessoalmente suas esperanças e delírios. Eram, definitivamente, parecidos demais.

Agora ele só quer sair por aí inventando passarinhos cantando na sacada, anunciando a felicidade no meio de tudo e contar esse segredo, vinte vezes por dia, na frente do espelho. Uma pequena receita que ele aprendeu por se deixar levar pelo amor escondido entre as linhas e pessoas. A ausência que faltava, pronta pra ser preenchida com a leveza das manhãs de domingo.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Confissão (ou pequenas respostas para suas perguntas)

Não me pergunte mais por que eu gosto tanto de você. As coisas são assim e pronto. Você já perguntou pro bem-te-vi por que é que ele insiste em cantar sempre às sete e meia da manhã na sua janela? E se todo esse tempo que você multiplicou as questões mais loucas ao meu respeito fosse repovoado por noites no cinema e porres na casa da sua melhor amiga? Se você pudesse voltar no tempo e dizer sim para todas as coisas estapafúrdias que eu te contei não seria melhor do que ficar sonhando no chuveiro com o cara que vai esbarrar com você numa esquina qualquer e convidá-la para um café?

Todo esse papo de amor não leva a nada, baby. As pessoas vivem choramingando por aí que não são compreendidas sem se dar conta de que o amor é, por essência, um sentimento incompreensível. Existe o casal que deu certo por que os dois são super parecidos; ela formada em agronomia e ele cantor sertanejo. Existe o casal que se ama por que os dois são extremamente diferentes; ela pianista de orquestra e ele tratador de girafas e os polos se atraem e talz. E existe quem não sabe explicar, assim como eu.

Se você quer mesmo saber, eu gosto de você por que suo feito um corredor de maratona gordo ao te ver chegar. Por que eu não consigo dizer uma só palavra do que tinha planejado quando me deparo com o infinito do seu olhar. Eu gosto de você por que ao seu lado a noite passa voando e eu não aprendi ainda a hora de partir. E faz tempo.

Olha, segura a minha mão, vou te contar um segredo. Quando eu conheci você não demorou muito pra eu me apaixonar por esse sorriso lindo que você tem e não me pergunte por quê que eu não vou explicar tudo de novo. Só não falei naquela mesma hora por que tinha muitas coisas pra resolver, principalmente dentro de mim. Estava mal, meio deprê e achando que o amor nem existia mais. Tinha saído de um relacionamento complicado, daqueles que a gente vê na novela e nunca acha que vai acontecer com a gente. Pois é, aconteceu comigo e foi foda. Então eu decidi não colocar você no meio de toda essa loucura que eu criei, decidi que no dia que me sentisse novo de volta eu daria um jeito de te dizer tudo que eu sentia. Então, let's play a game.

O amor é esse sentimento desajeitado, que fica sempre procurando um jeito de encontrar o ser amado sem medo de parecer ridículo. Esse mesmo jeito que eu tenho de ficar sempre te enchendo o saco, não me importando se somos tão parecidos ou completamente diferentes. Faz tempo que eu queria te contar isso, então chega de perguntas e me beija.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Se mal me queres.

Hoje eu acordei gostando de você um pouquinho mais. Sério. Assumo, em definitivo, que curto quando alguém não me dá bola. E olha, você é mestre nesta matéria de me ignorar. Talvez por que eu tenha mandado a trigésima quinta mensagem no facebook e você não respondeu. Talvez por que eu tenha pensado em você muito mais do que o normal. Acontece que hoje eu acordei gostando de você um tantão a mais.

Não digo isso para provar a minha personalidade insistente, que chega quase a cair no clichê melodramático do amor incompreendido. Digo por que eu quero você de verdade e não é nenhuma vergonha pra mim ficar implorando um minutinho da sua atenção. Acho até que, se estivéssemos no século XV e eu fosse esse mesmo cara que sou agora, aquele que escreve mil poesias para a donzela amada, eu seria o cavaleiro mais galante do pedaço. Mas eu não sei andar a cavalo e, cá pra nós, você não é tão donzela assim.

Sabe, talvez essa loucura toda, por esses anos todos, seja apenas pelo fato de você existir em mim sem existir pra mim. Talvez se você tivesse dito sim e caído de amores eu teria te esquecido no minuto seguinte. Ou se você fosse aquelas minas grudentas que a gente disfarça e finge que viu. Ou se você me telefonasse toda sexta feira às três da madrugada pra saber onde estou. Mas não. Você é daquelas que não dão a mínima. Daquelas que a gente precisa rastejar pra conseguir tomar um chope e conversar, mesmo que esse papo seja sobre o câmbio flutuante da Rodésia Oriental.

Hoje eu acordei gostando de você um pouquinho a mais. Dos seus olhos que não me olham. Das suas mãos que não me tocam. Da sua atenção que não é pra mim. Querendo provar essa omissão desejante no mais profundo desinteresse da sua parte. Eu gosto de você por que você é assim e, se desse jeito eu tiver você pra sempre, não me queira jamais.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Curioso.


Eu quero ler o seu diário. Saber quem foi seu último namorado, o endereço do seu trabalho e quando fumou seu primeiro cigarro. Eu quero conhecer você por dentro. Se o seu sobrenome tem acento, qual o andar do seu apartamento ou se já pensou em mim em algum momento. Eu quero conhecer você por fora. Toda e agora. Se algum dia bebeu e perdeu a hora e se sente vontade de ir embora.

Eu quero ler o seu diário. Aprender seu dicionário, se o que eu desejo é errado e quantas gavetas tem o seu armário. Eu quero você pra sempre. Descobrir a marca do seu absorvente só pra que não haja vergonha entre a gente. Eu quero entender suas manias, por que brigou com aquela amiga ou quando será o nosso grande dia. Eu quero reparar no seu pé. Fingir que você tem chulé só pra rirmos disso até quando der.

Eu quero ler o seu diário. Conhecer sua missa. Ser seu vigário. E dos beijos mais loucos de amor fazer um plágio. Eu quero saber cada detalhe, se sua carteirinha ainda vale e quais são as ervas que curam seus males. Eu quero ler sua cabeça e, antes que eu me esqueça, quero saber que horas são. Por que antes que a gente envelheça, quero saber se você deixa eu morar dentro do seu coração.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Até qualquer dia.


Depois de pedir para o garçom trazer outro copo e descer mais uma ele deu uma olhada bem no fundo daquela imensidão que eram os olhos dela e suspirou. Ei, você é a mulher da minha vida, disse sem remorso ou embargo qualquer em sua voz. E ela, aquela moça que trazia no sorriso os delírios mais bonitos, deu uma mordiscada no lábio inferior como se aquilo que ela não entendia fosse, ao mesmo tempo, a explicação de tudo. Tudo bem, respondeu sem parecer que sim ou que não.

E ela foi pra casa guardando aquele segredo como um passarinho frágil aninhado entre suas mãos e seu peito. Tinha medo que naquela altura da noite alguém viesse lhe roubar aquele presente precioso que acabara de ganhar há alguns instantes naquela mesa de bar. E a rua parecia mais estreita. Ou seria seu coração que passou a ficar mais apertado? Deu vontade de voltar, afinal de contas, ela também tinha tanto a dizer; pô, seu bobo, você não deveria sair por aí ofertando um poema às duas e meia da manhã. Naquela madrugada ela vestiu seu melhor sorriso, deu boa noite pro porteiro e subiu.


No táxi tocava a canção mais brega que ele já tinha ouvido. E ele se lembrava daquele cabelo loiro que mais parecia uma cachoeira de sonhos caindo como moldura pelos seus ombros. Era a sua noite mais incrível, aquela que ele iria contar para os netos dos netos e pra quem mais quisesse ouvir. E que tinha acabado com um abraço apertado e a certeza de que ainda iriam se ver. Então não acabou, pensou ele enquanto o taxista já parava em frente ao seu portão. Ao entrar em casa, ele olhou para o céu e agradeceu. Obrigado, Deus.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Sobre o gosto de estar junto.

Eu gosto de cada pouco do seu corpo todo. E me sinto meio canalha quando te imagino como uma jujuba; a áurea multicolorida e, quer saber, muito gostosa também. Eu gosto de você comendo coxinha, de você lambendo os dedos, de você pedindo outra caipirinha de saquê. Eu gosto de tudo que imagino quando a imaginação vai até você.

Eu gosto dos seus olhos distraídos, dos seus braços e abraços compridos e da marquinha de biquíni. De assistir você como um espetáculo da Broadway, toda resplandecente, num monólogo desconexo que eu passaria a vida a aplaudir. Gosto de você com cara de que não gostou. Gosto de cada gosto que sinto quando estou com você.

Eu gosto do seu perfume que eu ainda não descobri direito qual é. De você chamando o garçom. De você rindo aos montes da piada mais sem graça. Gosto de você sem meio termo. Sem medo de parecer ridículo. E que fique bem claro: eu gosto de você apenas pelo fato de gostar de você, mocinha.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Sobre nós e os outros.

Um dia ele vai chegar pra ela e dizer: tá tudo bem. E vai sair atrás de um táxi fingindo procurar um cigarro ou qualquer outra coisa pelos bolsos da calça. Ela vai ficar olhando de longe, ainda sentada naquela mesa de bar, ele sumir entre os carros que passam em sua frente. Sim, eu posso ver tudo isso daqui onde a gente está, na mesa ao lado.

Repara como ele olha pra ela enquanto bebe mais um gole de cerveja, como ele batuca freneticamente o cardápio quando ela se levanta para ir ao banheiro, como ele sorri de cada piada boba que ela conta. É certamente um cara apaixonado por cada detalhe daquela moça. Agora perceba como ela parece olhar para os lados toda vez que ele fala alguma coisa, como ela só balança a cabeça pra dizer que entendeu, como ela insiste em ficar verificando as mensagens no celular. Ela não gosta dele, é fato.

Talvez se conheceram na escola, ele um cara descolado e cheio de amigos que não dava a mínima para aquela mocinha de óculos e franja que sentava na primeira fila. Ela a mocinha de óculos e franja que nutria uma paixonite platônica por aquele cara descolado. Certo dia, na festa de alguém, eles ficaram. E ficaram. E ficaram. Até que hoje, depois de tantos anos, a coisa se inverteu; ele não parece mais tão cool assim e nem ela usa mais tanta maquiagem. É o fim, dá pra ver.

E você? Ainda gosta de mim? Olha, tá vendo aquele outro casal de meia idade sentado à sua esquerda? Eles não param de olhar pra gente. Provavelmente pelo fato de que o assunto deles acabou e eles começaram a sentir um pouquinho de inveja desse nosso papo cheio de risadas, caras e bocas. Talvez por que passaram a propor as mesmas conjecturas pro nosso amor assim como acabamos de fazer. Talvez por que os nossos olhos dão muita bandeira quando se perdem um no outro. Ah, e por falar nisso, eu te amo.

Tá, se você quer mesmo descobrir como eu sei disso tudo eu vou te contar. Eu já fui aquele cara. É verdade, antes de conhecer você eu poderia escrever um livro inteirinho sobre partidas. Se chamaria Tratado Completo da Despedida. Me apaixonei muitas vezes, você sabe, eu já te contei. Agora me parece que não vou mais publicar nada por que isso já não me pertence. Quando estou ao seu lado eu esqueço a hora de ir. Mesmo quando você, entre tequilas e sorrisos, me pede pra ir embora que já está tarde. Ao seu lado é onde eu quero ficar. Não importa até que horas. Não importa até quando. Desde que chegou, eu só quero ficar aqui pra sempre.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Tudo o que quiser agora.


Você precisa ir agora, tem um táxi te esperando lá embaixo. Não quero mais brigar, desculpa, não é omissão da minha parte ou qualquer coisa assim, eu só não estou mais afim de dizer coisas que você, provavelmente, não está interessada em ouvir e eu muito menos com paciência de sentir as palavras que diz entrando por um ouvido e saindo pelo outro. Pegue suas coisas.

Já chamei o elevador e pus entre suas roupas os retratos que tiramos juntos, faça o que quiser com eles. Imagino que talvez você possa aproveitar as molduras para enquadrar um novo amor. A gente não dá mais, sem problemas ou afetações. Mas, se quiser, pode ficar para um último café.

Quer saber? Não vá assim tão depressa, taxistas sempre podem esperar um pouco mais. Senta aqui e vamos conversar. Olha, eu nunca quis te magoar e tenho certeza que essa nunca foi sua intenção também. Pode ficar com a samambaia. E a cafeteira. Calma, pode deixar que eu seguro suas malas enquanto você ainda estiver por aqui.

Nunca fui bom com as palavras e me desculpa se eu não me sair assim tão bem como aqueles mocinhos dos filmes que você assiste, mas você vai fazer uma puta falta aqui pra este apartamento. Pra esse vazio que vai ficar entre o encosto do sofá e eu. Pra mim e pra tudo que ainda sobrou. Uma falta imensa por que tudo em você é completude. E é isso que me irrita. E me faz amar você por tudo.

Fica. Eu menti sobre o táxi. E sobre o elevador. E sobre não querer ver nunca mais essa cara linda me acordando pra dizer que está começando um programa bobo na televisão. Fica por que eu não saberia mais me reconhecer no espelho sem o brilho nos olhos que você me proporciona. Fica por que eu vou mudar. Eu mudo tudo o que você quiser e prometo regar a samambaia de três em três dias. Fica por que eu te amo. Você não precisa ir agora.