quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Menino.



E ela sentou num canto, acendeu seu Marlboro e fumou. Me adimirava sempre que a via assim, de perfil, à meia luz, embaçada pela fumaça que cortava o ar e pautava inefavelmente o silêncio. Essa era a hora dela, é fato. A hora que ela esquecia o valor do conserto do carro, o limite do banco, a vizinha escrota e os dissabores desse amor contorcido, de poucos planos e ideias abstratas. A hora que ela lembrava que era inteira, que tinha sonhos, que sentia prazer como qualquer outra e não era qualquer menino bobo que iria lhe fazer chorar. A hora que ela se sentia ela. Ela e a fumaça perdendo-se no espaço. E eu ficava ali, no outro canto da cama, no outro campo da semântica, só observando aquela completude.

De repente ela vira e me pergunta: Pra quê?

( Vem sentar aqui do lado, passeia as mãos na minha nuca, me conta uma piada, me conta sua infância, me come, me toma de volta, não deixa eu aqui, sózinha, dando tragos nessa solidão a dois. Vem cá. )

- Pra quê o que?

( Me chama aí que eu vou agora, sem medos, sem deixar o passado exposto como uma ferida aberta. Me chama e deixa eu ser o teu band-aid. Eu não curo, não saro, não cicatrizo, mas cubro e não deixo infeccionar. Me chama de seu que eu fico. )

E ela se levantou e foi fazer café. Deixou a porta aberta e a impressão de que eu nunca entenderia a cabeça de uma mulher.

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